Quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007

          

Folha de S. Paulo
"Çosialismo 21"
Antonio Delfim Netto


 

A TERCEIRA posse (de um número que ele pretende infinito enquanto dure...) de Hugo Chávez foi um espetáculo extraordinário.
A grande novidade foi o lançamento do "Çosialismo" do século 21. Talvez ele tenha abusado do velho dito latino "Semel in anno licet insanire", que autoriza a todos, uma vez por ano, fingir-se de louco.
O mais provável é que sua alegria vá mostrar mais uma vez como o caminho para o inferno é pavimentado por generosas intenções. E os venezuelanos, com a "Ley Habilitante", vão aprender que aquele é apenas a verdade descoberta tarde demais...
Causou, entretanto, um enorme e injustificado "frisson" no mercado financeiro nacional a sua afirmação de que vai "fechar" o seu Banco Central. Falta de lógica da tribo neoliberal!
Chávez descobriu como criar o "homem novo" (alguém lembra de descobertas semelhantes em outros carnavais?), que não se moverá pelos indecentes incentivos egoístas do capitalismo, mas pela solidariedade humana e pela obediência à vontade soberana do líder. Este saberá o que é o bem para cada um de seus súditos e, melhor do que qualquer empresário, como combinar eficientemente os fatores de produção para atendê-los. A inflação será apenas uma lembrança amarga de um tempo em que uma organização social injusta lhes era imposta. Logo, não é preciso um Banco Central.
As sociedades que ainda não receberam a graça da "iluminação" chavista terão, infelizmente, de continuar a conviver com seus Bancos Centrais e, o que é pior, terão de dar-lhes autonomia operacional para que possam atingir as metas que receberem do poder político. A experiência mundial dos últimos 30 anos mostrou que a "meta inflacionária" é um sistema muito superior de controle da inflação do que os "pactos" entre governo, trabalhadores e empresários que costumávamos utilizar nos anos 70/80.
No caso brasileiro, cremos que sejam necessários pelo menos dois aperfeiçoamentos para dar maior transparência e credibilidade à ação do Banco Central: 1º) uma clara definição de quais são os indicadores objetivos que separam o "ruído" do fato, isto é, que mostram quando a média do processo inflacionário (em torno da qual a taxa de inflação varia aleatoriamente) ameaça deslocar-se e exige, portanto, uma ação sobre a taxa de juros e 2º) os votos dos membros do Copom devem ser justificados por escrito e oportunamente publicados para que se conheçam suas razões.

contatodelfimnetto@uol.com.br

ANTONIO DELFIM NETTO
escreve às quartas-feiras nesta coluna.