Opinião

 

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Governança e governabilidade

na modernização das empresas

de saneamento

Antonio Zuccolo (*)

Se numa reunião alguém afirmar que a maioria das instituições que promove ações em saneamento não consegue ter acesso ao capital, com certeza não vai haver quem o conteste.

Enfim, as finanças se globalizaram, mas as empresas de saneamento não e, regra geral, para manter um nível mínimo de crescimento, estão esgotando sua capacidade de investimento utilizando quase que exclusivamente saldos de caixa. Só por isso é que continuam realizando alguns empreendimentos, mas em volume insuficiente para atender a demanda. 

Ao tentar estruturar alguma operação de crédito para investimentos para as empresas, os agentes de crédito se encontram diante de grandes problemas.

Os organismos multilaterais de crédito, por exemplo, gostariam de tratar seus projetos de financiamento com empresas em que eles confiassem. Como existe desconfiança, eles acabam tendo que vincular a continuidade de qualquer negociação à implementação de programas que não raras vezes acabam envolvendo contratos de gestão de difícil implementação. Na CEF não está sendo muito diferente. Foram modelados vários tipos de operações de crédito que aparentam, aos potenciais tomadores, estar tentando tratar o novo como sendo a parte boa e o velho como a parte ruim. Também o BNDES agiu de forma parecida quando concedeu empréstimos a algumas companhias com o compromisso de que fossem privatizadas.

A verdade é que, na grande maioria dos casos, as propostas no sentido de forçar as empresas de saneamento a adotar determinados modelos de gestão não têm encontrado muita receptividade no plano político.

Mas o que se percebe é que as empresas aceitariam que se pusesse em prática um sistema mínimo de recompensas e penalidades desde que não tivessem que se submeter a processos que as forçassem a privatizar ou fazer concessões ou mesmo criar unidades de trabalho desconectadas do seu dia a dia. O que fazer então?

A solução deveria partir do princípio de que: a análise dos mecanismos de decisão que concluem pela priorização de determinados empreendimentos é hoje tão importante quanto a análise do próprio empreendimento.

 E para que isso aconteça é preciso que as empresas dêem provas permanentes de que o pensamento entre todos os envolvidos no processo decisório esteja alinhado em torno de uma agenda única.

Portanto estamos falando em governança corporativa.

Mas como é que podemos aplicar regras de governança em empresas onde os interesses do controlador confundem-se com os dos stakeholders (público de interesse)?

Não se pode dizer que nas empresas de saneamento não há a prática da governança. Há sim, na grande maioria. Mas é uma governança informal que acaba ficando ao sabor da política do momento. Aí, quem está de fora da organização acaba não compreendendo o seu funcionamento e, não raras vezes, acaba julgando que a agenda política se sobrepõe o tempo todo à da empresa.

 Com isso o acesso ao capital acaba se tornando uma corrida de obstáculos.

Devemos pensar, não simplesmente em mais um conjunto de regras que as empresas de saneamento teriam que obedecer para candidatar-se ao capital. Se assim fosse feito, a reação política que viria das dificuldades de governabilidade seria tão forte, que o carimbo de uma nova aventura seria rapidamente estampado nos manuais do projeto.

O que estamos propondo é a criação de programa de preparação institucional das empresas. Ao aderir ao programa a empresa estaria buscando amparo para implementar soluções profiláticas de maneira a poder tornar-se suficientemente saudável, melhorar seu desempenho e ter acesso mais fácil ao capital.

E por onde começar?

Antes de tudo é importante lembrar que as ações necessárias têm tudo a ver com o sentido humano e político dos órgãos de decisão das organizações.

Nesse sentido, ampliar e popularizar a oferta de cursos de formação de pessoal é sempre uma boa idéia. O problema é que, em geral, os cursos não habilitam necessariamente aqueles que estejam gozando também dos créditos políticos para desempenhar determinadas funções. Mas, em médio prazo, os cursos serão sempre úteis.

Se pensarmos de forma pragmática vamos ver que é fundamental que se disponha de um dicionário que traduza o significado de cada um dos termos da  governança para a realidade política vivida pelas empresas de saneamento. Assim, por exemplo, quando estivermos falando dos acionistas controladores é preciso que se compreenda que os mesmos são representados por um poder transitório que lhes foi delegado nas urnas. Neste caso o acionista controlador poderia ser o chefe do executivo, por intermédio de um fórum qualificado para tal função, nos moldes de algumas empresas  que têm no processo decisório, outras componentes diferentes do lucro financeiro.

Pode parecer uma tarefa árida, tentar buscar a descrição sistemática das relações entre todos os envolvidos, mas convém lembrar que governança é possível existir até nas empresas familiares, que viveram e ainda vivem problemas até mais complexos que os decorrentes da política.

Já se sabe de antemão que a implementação , de regras de relacionamento entre os controladores, os conselheiros, a diretoria executiva, a auditoria independente e o conselho fiscal, bem como da ligação destes com o público de interesse, exigirá que se tenha em mãos, além de uma perfeita definição do papel de cada uma das partes envolvidas, de um diagnóstico que traduza a situação do estágio de governança em que as empresas se encontram.

O importante é que o objetivo final seja a busca de um melhor alinhamento das agendas das instituições de crédito com as das empresas de saneamento.

 

(*) Antonio Carlos Franco Zuccolo é engenheiro, especialista em saneamento e consultor na área de desenvolvimento institucional. :20012004:

 

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