A tarifa única para o saneamento poderá cobrar 
                indiscriminadamente pelos serviços de esgoto, mesmo que o ramal 
                não esteja conectado à rede publica. O tema é controverso e 
                provoca ao debates.
                
                Para falar 
                sobre o assunto, o Aqua ouviu o biólogo João Paulo 
                Capobianco, atual presidente do IDS (Instituto Democracia e 
                Sustentabilidade). Capobianco foi secretário nacional de 
                Florestas e Biodiversidade e secretário-executivo do Ministério 
                do Meio Ambiente, entre 2003 e 2008. 
                
                Aqui ele 
                responde sobre o tema e comenta a 
                proposta da Sabesp. Leia abaixo a entrevista completa.
                
                 
                
                
                
                Aqua: De que forma a tarifa única para o saneamento difere da 
                tarifa atual?
                
                
                
                João Paulo Capobianco: 
                Não está claro como seria na prática a fusão das tarifas de água 
                e de esgoto em única tarifa de saneamento que Jerson Kelman, 
                presidente da Sabesp, está propondo. O que é possível afirmar é 
                que o funcionamento atual da tarifa de água e esgoto apresenta 
                vários problemas, incluindo questões de justiça social e 
                sustentabilidade.
                
                
                Atualmente, a conta que os consumidores 
                recebem mensalmente apresenta duas colunas, a tarifa de água e a 
                tarifa de esgoto. Sendo a segunda uma simples conta aritmética, 
                equivalente ao dobro da primeira. Esse fato já revela um 
                problema de falta de transparência e de ausência de compromisso 
                com a efetiva universalização do saneamento básico. Isto porque, 
                segundo os especialistas no tema, o custo operacional da coleta 
                e tratamento de esgoto é da ordem de 3 a 4 vezes o da captação, 
                tratamento e distribuição da água.
                
                
                Se o custo operacional é maior, porque o 
                valor é o mesmo? A sociedade precisa ter clareza a respeito 
                desses valores, para pagar o que realmente recebe e ter clareza 
                sobre os investimentos necessários e como viabilizá-los. Somente 
                assim será possível dar a prioridade necessária para o 
                saneamento.
                
                
                Por 
                fim, há outro problema grave: a tarifa de esgoto é cobrada de 
                maneira indiscriminada entre um determinado consumidor X que tem 
                seu respectivo esgoto coletado e tratado e o consumidor Y que 
                possui seu esgoto somente coletado. Segundo notícia veiculada no 
                jornal 
                Estado de São Paulo na data de 15 de agosto de 2016, 
                o TCE (Tribunal de Contas do Estado) afirmou em relatório que 
                somente em 2014 a Sabesp arrecadou indevidamente R$ 357,5 
                milhões pela cobrança de serviço de tratamento de esgoto que não 
                foi efetivamente prestado.
                
                
                Por que não há essa diferenciação na 
                conta, com um valor para a água, outro para esgoto coletado e 
                outro para esgoto tratado? Existem diversos lugares no mundo e 
                no Brasil que praticam a cobrança dessa forma. A Sabesp e a
                 
          
                
                Arsesp 
                (Agência 
                Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo) devem essa explicação à sociedade. 
                
                
                
                Considerando os elementos expostos acima, 
                me parece que a implantação de uma tarifa única agravaria o 
                problema, tornando-a ainda menos transparente, e injusta.
                
                
                
                Que benefícios a nova tarifa pode trazer para o concessionário? 
                E para o consumidor?
                
                
                Depende de qual nova tarifa estamos 
                falando. 
                
                
                O 
          
                
                IDS está participando do debate a respeito da revisão 
                tarifária da Sabesp com o intuito de "abrir a caixa preta", 
                aumentando a transparência sobre como é definida e calculada e 
                propondo mecanismos para que a tarifa auxilie a alcançar os 
                objetivos do 
          
                
                Plansab 
                (Plano Nacional de Saneamento Básico): 
                universalização do acesso à água potável, coleta e tratamento do 
                esgoto. Os dados do Sistema Nacional de Informações sobre 
                Saneamento indicam que, somente na cidade de São Paulo, 
                principal polo econômico do Brasil, no ano de 2015 existiam mais 
                de 95 mil pessoas sem acesso à água potável e mais de 430 mil 
                sem acesso a esgotamento sanitário. Soma-se a isso o fato da 
                Sabesp despejar diariamente nos corpos hídricos da cidade mais 
                de 300 milhões de litros de esgoto coletado e não tratado. São 
                números alarmantes, que demonstram o descompasso entre a gestão 
                do saneamento e as necessárias melhoria das condições de saúde e 
                qualidade de vida dos paulistanos.
                
                
                A 
                proteção dos mananciais e a coleta e tratamento de esgoto, têm 
                que se firmarem como prioridade das políticas públicas. Os 
                benefícios de uma tarifa que promova esses objetivos superam os 
                limites ambientais, e gera impactos positivos em todas esferas, 
                desde saúde pública, habitação, educação e economia. Segundo 
                dados da Organização Mundial da Saúde, na América Latina e 
                Caribe, para cada dólar investido em esgotamento sanitário, há 
                um retorno econômico da ordem de 7,3 dólares. E, para cada dólar 
                gasto em distribuição de água potável, há um 
                retorno econômico 
                da ordem de 2,4 dólares.
                
                
                Outro aspecto importante é que o modelo de 
                tarifa ideal é aquele que também contempla a questão da 
                manutenção da disponibilidade hídrica de nossos mananciais. 
                Nesse sentido, os exemplos de Nova York, Juiz de Fora (MG) e 
                Botucatu (SP) deveriam ser inspiradores para a gestão ambiental 
                em São Paulo. Nos dois primeiros casos, as empresas responsáveis 
                pelo saneamento adotaram a estratégia de comprarem áreas de 
                mananciais para protegê-los. No caso de Juiz de Fora, a 
                Prefeitura, empresa e agência reguladora identificaram 
                conjuntamente duas áreas de mananciais prioritárias e 
                estabeleceram uma destinação específica de 1,25% da receita 
                tarifária para protegê-la. Em Botucatu, foi definida a 
                destinação específica de 1% da receita tarifária para projetos 
                de Pagamentos por Serviços Ambientais.
                
                
                
                Informações mais detalhadas podem ser acessadas no estudo que o 
                IDS e Aliança pela Água divulgaram em 2016: 
                
                
                https://goo.gl/YvJgp3.
                
                
                
                Com a tarifa única, a conta de água vai aumentar?
                
                
                Não é possível afirmar se a conta vai 
                subir ou não com uma eventual tarifa única. 
                
                
                Claro que isso é uma preocupação legítima 
                da sociedade. No entanto, há uma discussão anterior à questão 
                "vai aumentar ou não a conta de água", que deve considerar três 
                aspectos: Quais os custos reais da operação dos sistemas de água 
                e esgoto? Quem decide sobre o valor da tarifa? Como é aplicado o 
                valor arrecadado a partir da tarifa?
                
                
                Para o IDS, a sustentabilidade e justiça 
                social são os pressupostos para qualquer debate. A cobrança de 
                uma tarifa fixa dos usuários que consomem até 10 m³ por mês, por 
                exemplo, precisa ser revista, pois muitos pagam pelo que 
                efetivamente não consomem. Segundo notícia veiculada no jornal 
                Estado de São Paulo em 15/08/2016, o Tribunal de Contas do Estado afirmou em relatório que, somente no ano de 2014, a Sabesp 
                arrecadou indevidamente R$ 455,5 milhões. Isto porque forneceu 
                331,4 bilhões de litros a esses usuários da primeira faixa de 
                consumo, mas cobrou pelo equivalente a 573,5 bilhões de litros.
                
                
                Do ponto de vista da sustentabilidade, 
                essa cobrança mínima compulsória é, ainda, profundamente 
                contraditória com as boas práticas de gestão, pois não induz ao 
                consumo responsável e racional. Um determinado usuário que 
                costuma consumir mensalmente 3 m³, é estimulado a aumentar 
                esse consumo, pois paga por mais do que três vezes o que 
                efetivamente utilizaria. 
                
                
                
                Hoje, a tarifa de esgoto é cobrada de quem está com o ramal 
                conectado à rede pública, portanto, apenas o usuário do serviço 
                é pagador. Se o ramal de esgoto não estiver ligado por falta de 
                rede disponível, a tarifa única estará cobrando serviços de quem 
                não faz uso deles. Como o senhor vê essa questão?
                
                
                Como já dito, a maneira como o sistema 
                funciona atualmente já apresenta muitos problemas. Não é verdade 
                que “apenas o usuário do serviço é pagador”. Um cidadão que 
                recebe em sua residência a cobrança da tarifa de esgoto, entende 
                que está pagando pelos serviços de coleta, afastamento e 
                tratamento de meu efluente. No entanto, isso nem sempre 
                acontece. Muitas pessoas pagam, mas têm seu esgoto somente 
                afastado. Esse fato gera o “bem empresarial, mal coletivo” que 
                mencionei em artigo no jornal Folha de São Paulo de 27/01/2016, 
                uma vez que a empresa arrecada, não executa o serviço e promove 
                um dano socioambiental de grande escala.
                
                
                Em 
                2015 foram mais de 311 milhões de litros diários de esgoto que a 
                Sabesp coletou e não tratou, somente na cidade de São Paulo, 
                segundo os dados do 
                Sistema Nacional de Informações sobre 
                Saneamento. 
                O usuário precisa ter clareza sobre quais serviços está sendo 
                cobrado e quais estão sendo efetivamente executados.
                
                
                Nesse sentido, a tarifa única pode 
                aprofundar todos esses problemas. Por isso não compartilho da 
                ideia de que ela seja a solução para nossas dificuldades atuais.
                
                
                
                Há décadas, São Paulo investe milhões em esgoto sanitário, mas 
                os rios Tietê, Pinheiros e seus afluentes da Capital continuam 
                com a mesma aparência: poluídos e fétidos. Com a nova tarifa, 
                isso acaba? 
                
                
                A situação das águas de nossos rios só 
                mudará quando essa for uma real preocupação da sociedade. A 
                tarifa é somente uma parte da equação.
                
                
                Os 
                últimos dados relacionados à 
                eleição municipal de São Paulo 
                mostram que o tema "saneamento básico" esteve presente somente em 6% 
                das manifestações dos principais candidatos à prefeitura. Isso 
                comprova a baixa importância que os cidadãos conferem a esse 
                enorme problema socioambiental. Via de regra, as pessoas só 
                percebem as consequências da má gestão da água em dois momentos: 
                nas enchentes ou na escassez hídrica. 
                
                
                A discussão a respeito da tarifa de água e 
                esgoto representa bem a estreita relação entre os valores da 
                sustentabilidade e da democracia. Isto porque, por um lado ela 
                pode ser um instrumento orientador de práticas sustentáveis, 
                equalizando as relações de demanda e oferta de água, e, por 
                outro, através da transparência sobre seu funcionamento, seja 
                nos critérios utilizados para definir os valores cobrados, seja 
                no cálculo e nas decisões sobre as prioridades para a aplicação 
                de seus resultados, um poderoso instrumento de envolvimento da 
                sociedade em decisões sobre questões estratégicas de saúde, 
                economia e meio ambiente. Um processo mais participativo e 
                transparente seguramente contribuirá positivamente para a 
                legitimidade e eficiência da tarifa.
                
                
                
                Na hipótese de implantação da tarifa única, é possível prever um 
                prazo para a despoluição definitiva?
                
                
                Só podemos prever um prazo de 
                universalização de acesso à água e esgoto quando saneamento se 
                tornar uma preocupação social constante. 
                
                
                Em 
                2017 e 2018 ocorrerá a revisão tarifária da Sabesp, ótima 
                oportunidade para que a sociedade participe de um processo que 
                gerará impactos não somente econômicos, mas também de ordem 
                social e ambiental. No período de 27 de março a 19 de maio será 
                realizada pela Arsesp a abertura de consulta pública e audiência 
                pública. O cronograma com maiores detalhes pode ser 
                consultado 
                aqui.
          
          
          
                 
                
          
          
          
          
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